História

O MOVIMENTO COOPERATIVO

 

O Cooperativismo em Portugal tem raízes seculares, vindas dos Celeiros Comuns e mutualidades criadas por iniciativa particular ou intervenção de reis, municípios ou mesmo de paróquias.
Ao tempo, as trocas diretas predominavam sobre a circulação da moeda. Havendo escassez de alimentos, era necessário socorrer os agricultores, adiantando-lhes sementes, tal como um empréstimo que seria retribuído em géneros da mesma espécie.
Gradualmente, o pagamento em géneros foi sendo substituído por pagamento em dinheiro, aparecendo as primeiras instituições de crédito que, após a implantação da Republica viriam a ser regulamentadas como Caixas de Crédito Agrícola.

 

Nos Açores, a situação económica do início do século XX era de grande fragilidade. A época áurea da laranja já conhecera o seu declínio, despontava a produção do ananás, cujo potencial de exportação era depreciado, fazendo-se sentir, em simultâneo, os terríveis efeitos da primeira guerra mundial.
Mas a banca (banco micaelense), os transportes (carregadores açorianos) e os exportadores (sociedade corretora) prosperavam, com a exportação do ananás para o norte da Europa.
É neste contexto de necessidade de proteger os produtores que nascem as primeiras organizações de escopo cooperativo, como o Sindicato dos Cultivadores de Ananases da Ilha de São Miguel ou a cooperativa “A Fornecedora”, que pouco tempo depois criam o crédito agrícola, contaminando os produtores agrícolas em geral para a criação de outras cooperativas em vários setores de atividade.
O que retemos desta breve abordagem é que, perante a carência, a cooperação e entreajuda das pessoas é capaz de reunir as condições para a adequada e necessária resposta.

 

 

OS LATICÍNIOS NOS AÇORES

 

Lendo as “Saudades da Terra”, de Gaspar Frutuoso, o mais antigo cronista açoriano (1580-1590), conclui-se que, aquando do povoamento destas ilhas, foi deitado gado entre o espesso mato. Carneiros e ovelhas, bodes e cabras, porcos e porcas, cavalos e éguas, asnos e burras, bois e vacas, que se multiplicaram e, como havia bons pastos de erva e rama, estas ilhas eram tão fartas que, nas árvores se dependurava a carne e repartia, sem preço e de graça a comiam. E também no dizer de tal cronista, “…o leite é muito grosso e assim faz muita manteiga, e em nenhuma parte dão as vacas mais…”
Apesar de existir vacas e leite por todas as ilhas, a tecnologia de transformação do leite em manteiga, reduzia-se à desnatação espontânea e batedura em pote, em fabrico caseiro, como também acontecia com o queijo.

 

O gado bovino inicialmente introduzido no arquipélago não era de vocação leiteira e apenas com o impulso da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense (1843) foram introduzidas espécies de raças com maior vocação para a produção de leite, como a “Holandesa” – a Holstein-Frísia que até hoje prevaleceu, cuja subsequente melhoria genética foi sendo feita com a importação de reprodutores.
Tais diligências, que aumentaram a produção de leite, impulsionaram o aumento da área de pastagens artificiais e a utilização de adubos, ao mesmo tempo depreciando o valor da carne.

 

Com o aumento da produção algumas as pequenas indústrias que preservavam tradições familiares, introduziram maquinaria movida por noras de tração animal, porém, a partir dos últimos anos do século XIX a nossa agricultura entra numa profunda crise, com excedentes de leite em São Miguel a reclamarem investimentos para introduzi máquinas a vapor para a desnatação do leite e batedeiras (que vieram de Inglaterra) para além da contratação de mestres queijeiros para melhorar o fabrico de queijos.
Não obstante os novos equipamentos, a intervenção dos Serviços Pecuários da Junta Geral para melhorar os efetivos leiteiros era cada vez mais intensa. Após a primeira guerra mundial (1914-1918) existiam em São Miguel mais de cinquenta indústrias (para além dos fabricantes caseiros), mas apenas meia dúzia produzia queijo e manteiga, sendo esta distribuída ao domicílio.

 

Entretanto, exigências da Intendência de Pecuária para melhorar a higiene fizeram reduzir o número de indústrias, pelo que a produção de leite começou, de novo, a ultrapassar a procura existente pois o consumo público não absorvia o que a indústria remanescente não transformava e, ao mesmo tempo, no mercado continental se começava a sentir a concorrência de margarinas importadas.

 

Em resposta a esta nova crise realizaram-se reuniões por toda a ilha de São Miguel, para motivar os agricultores na criação de uma cooperativa, com dimensão viável e contratação de técnicos para o desenvolvimento tecnológico e industrial, projeto que, em outubro de 1937, foi aprovado pela Comissão Administrativa da Junta Geral, que financiaria a construção e apetrechamento moderno de uma fábrica, cedendo-a à cooperativa dos produtores de leite que tudo pagaria com juros e em prazo a combinar.
O então Sindicato Agrícola de Ponta Delgada chegou a abrir inscrições de lavradores interessados em participar na cooperativa que, sendo suficientes, justificaram a apresentação do projeto da fábrica, que laboraria 25.000 litros diários, em leite para consumo público pasteurizado, engarrafamento e frigorificação, manteiga, natas frescas e aproveitamento do leite desnatado para o fabrico de queijo de tipo “cheddar” e “holandês”, para além de ainda perspetivar uma segunda fase para o fabrico de caseína e leite em pó ou condensado.

 

Em 27 de janeiro do ano 1938 foi realizada uma assembleia geral do Sindicato Agrícola que aprovou por unanimidade os estatutos da “Cooperativa de Lacticínios de S. Miguel” e elegeu os respetivos corpos gerentes. Noutra reunião, em setembro do mesmo ano, foi deliberado pedir a isenção do pagamento de juros, o aumento do prazo do reembolso e proceder à concentração fabril na produção de manteiga e queijo.
Ultrapassadas todas as dificuldades iniciais, o certo é que nada aconteceu porque, após tais reuniões, foi iniciada uma campanha contra os benefícios da cooperativa, lançando os lavradores num clima de desconfiança e medo, com o intendente de pecuária a declarar o fracasso do projeto.

 

A tal insucesso estará ligada a iniciativa privada que, minando o trabalho das reuniões de lavradores, em 1937 criara a sociedade por quotas “Lacticínios Loreto, Lda” que, arregimentou os incrédulos da solução cooperativa e aproveitou a antiga fabriqueta “Lacticínios do Tanque”, na zona das Laranjeiras em Ponta Delgada, onde depois iniciou a construção e inaugurou a primeira fábrica moderna em 1947, passando a produzir diferentes tipos de queijo e manteiga, mas também outos produtos feitos com a caseína retirada do leite desnatado, como botões de roupa ou tabuleiros e peças de jogos de damas.
Reforçando a sua proximidade da lavoura, a “Lacticínios Loreto, Lda” e reforçando disponibilidade financeira, abriu aumentos do seu capital social à subscrição de produtores de leite, proprietários, empresários como a “Martins e Rebelo” que já se estabelecera na Ilha das Flores em 1920 e depois nas ilhas do grupo central, e até aos próprios trabalhadores.

 

Com o início da II Guerra Mundial as industrias locais, que à exceção da “Lacticínios Loreto” tinham produtos de duvidosa qualidade, escoavam toda a produção, inclusive abastecendo navios em trânsito, assim incrementando a produção leiteira, o que se traduziu na arroteia de novos terenos para pastagens.
Com o fim da II Guerra Mundial a insuficiência de oferta de produtos lácteos desapareceu, ocorrendo novo período de oferta superior à procura de leite, e novamente as autoridades indicam que, excetuando a “Lacticínios Loreto”, as restantes fábricas de lacticínios não tinham condições aceitáveis, dando-lhes prazo para construírem novas fábricas sob pena de perderem o seu licenciamento industrial e serem enceradas.

 

No final de 1946 existiam a Lacticínios Loreto, Lda., os industriais António Luiz Pacheco, José Moniz Furnas, Manuel Pereira Gomes, Aguiar e Oliveira, Lda., a Empresa de Lacticínios Arrifes, Mariano Rebelo Pimentel, Manuel de Sousa Pedro e José de Sousa Pedro e ainda as fábricas de José Furtado Leite Lda. e de João Maciel, que obtiveram uma prorrogação do prazo para modernizarem instalações até ao fim de 1947, algumas por associação à Sociedade Lacto-Lusa, de Vale de Cambra.
Ora, desde os finais do século XIX que o cooperativismo começara a ser objeto de estudo económico, como forma dos pequenos produtores ganharem força e eficiência na aquisição de produtos, com particular incidência nos fatores de produção como os adubos, ou na venda das suas produções ao público, contornando intermediários, especuladores e oportunistas.

 

Em França o modelo cooperativo começava a mostrar vantagens, primeiro na recolha do leite para o vender a fábricas de queijo e, depois, na própria produção de queijos. Na Dinamarca, o modelo cooperativo era fortíssimo na produção de manteiga e toda a pequena agricultura tirava o maior proveito da associação cooperativa, para poder produzir com a qualidade.
Em Portugal o setor contava com sindicatos agrícolas, que apareceram primeiro nos Açores e que depois foram extintos com a criação dos grémios da lavoura. E apesar da lei portuguesa, desde 1867, prever a criação de cooperativas, só na década de 1920 é que estas começaram a ganhar alguns adeptos.
Apesar dos avanços do modelo cooperativo por toda a Europa, nos Estados Unidos da América e no Canadá, o certo é que, defendendo os interesses coletivos em detrimento dos particulares, os seus opositores conotavam-no com ideologias socializantes, arredando gente do modelo.

 

Apesar do clima de desconfiança lançado contra o cooperativismo, no sector do leite e lacticínios apareceram nos Açores cooperativas, as primeiras na ilha de São Jorge, por influência de padres-mestres e de emigrantes dos Estados Unidos e Canadá. É o caso da Cooperativa Agrícola da Beira, criada em 1927 (será mesmo a mais antiga do país) e a Cooperativa Agrícola das Manadas, de 1939, ambas no concelho de Velas.
Foi, porém, a partir de 1944 que foram aprovados vários alvarás para cooperativas, anexas aos grémios da lavoura, a maioria delas na área do leite, apesar da oposição dos industriais do sector que, junto dos produtores, insinuavam perigosas conotações políticas, pressionando igualmente os responsáveis políticos.
Legalmente, as cooperativas podiam agregar a sua ação a um nível superior, criando as Uniões de Cooperativas, como forma de ganhar efeitos de escala na sua ação perante o mercado.

 

Foi assim que, em 1946, surgiu nos Açores, a Federação das Cooperativas de Lacticínios da Ilha Terceira que, em 1961, adequou a sua designação para União das Cooperativas de Lacticínios Terceirense (UNICOL), e que em São Miguel surgiu a UNILEITE, em 1954, associando as cooperativas leiteiras da ilha de S. Miguel que entretanto se haviam sido criadas.
Entretanto, desde a tentativa de criação da “Cooperativa de Lacticínios de S. Miguel” que entre alguns grupos de lavradores de S. Miguel ficara o ideal cooperativo.
Nos Arifes um grupo de lavadores constituiu a “Cooperativa Agrícola do Bom Pastor”, em 1948, a qual terá começado por explorar a distribuição de leite à população e de uma manteigaria local.
Depois, com a sua participação liderante, sabendo da necessidade de criação de uma fábrica da lavoura, a Cooperativa Agrícola do Bom Pastor, com outras cooperativas depois de si criadas, constituíram a União das Cooperativas Agrícolas e de Lacticínios de São Miguel.

 

Construída a fábrica da lavoura, a BOM PASTOR passou a focar a sua atividade na compra de fatores de produção para disponibilizar aos seus associados, mais uma vez contra e desafiando interesses privados instalados, utilizando a capacidade de armazenagem de alguns lavradores. Depois, já na década de 1980, construindo o seu próprio armazém nas Arribanas – Arrifes, que mais tarde cedeu ao património da UNILEITE que, em terenos contíguos e quando era liderada pela BOM PASTOR, como sua maior cooperativa agrupada, construiu a sua moderna fábrica de lacticínios inaugurada no ano 2000.
Também na mesma altura, a BOM PASTOR, com as sinergias estabelecidas com a construção da nova fábrica, a norte e para esta voltada, construiu as suas novas instalações, que têm vindo a crescer ao longo dos anos.

 

 

O MELHOR DA NOSSA TERRA

 

A Cooperativa Agrícola do BOM PASTOR, C.R.L. é a importante parceira dos agricultores de S. Miguel, pretendendo continuar a sê-lo para reduzir custos de produção e aumentar a eficiência e o rendimento das explorações. No prelúdio de uma nova era de preocupações ambientais, queremos inovar e apostar no desenvolvimento sustentado com a constante modernização da Agricultura da nossa terra.
Procura disponibilizar aos nossos Agricultores os melhores fatores de produção, bons serviços de apoio e de assistência, e de contribuirmos para reforçar a sua formação e informação como forma de valorizar as suas atividades.

 

A nossa prioridade e motivação é a satisfação global dos nossos Agricultores, que são a razão de ser da nossa existência. A BOM PASTOR quer ser uma exemplar referência na contribuição para a criação de valor na nossa agricultura e pecuária, num permanente compromisso com as sucessivas e dignas gerações de Agricultores.
Acreditamos e defendemos a importância da Agricultura, o sucesso do sector e a dignidade e o rendimento dos Agricultores.
Foi a cooperação, feita como reação às dificuldades extremas dos nossos fundadores, que nos deu origem.
É a cooperar que continuaremos a vencer todas as adversidades, a defender os nossos rendimentos, a dar bom nome à Agricultura e aos Agricultores e a valorizar a nossa terra.